Obsessão pela felicidade

Enquanto esperamos pela vida, a vida passa.
Sêneca

Por todo o lado, você vê essa palavra: livros, revistas, blogs, palestras, cursos e até no autofalante do supermercado. “Felicidade”. Como se ela fosse um lugar e a única coisa que precisássemos para chegar lá fosse um bom mapa. E não faltam mapas que prometem levar você para esse paraíso perdido, desde a propaganda na TV ao mais novo livro de autoajuda.

O próprio fato de se enxergar a felicidade como um algo que se atinge algum dia se você fizer uma certa coisa é um obstáculo. Pois cria-se a concepção de que existe uma maneira certa de viver e que, se você seguir à risca, chegará num ponto em que sua vida se transformará num mar infinito de êxtase, alegria e satisfação. E enquanto buscamos essa Eldorado no meio da selva do cotidiano, com os olhos no mapa, a nossa vida vai passando.

Hoje as promessas da moda são o mindfulness e a meditação — que são ótimas práticas, mas ao serem colocadas como receitas para a felicidade, já perdem a sua essência. Pois tanto o mindfulness e a meditação não são receitas para a felicidade. São formas de, talvez, desenvolver a sabedoria. E a sabedoria também não é garantia de felicidade, mas sim a capacidade de conseguir ver as coisas tais como elas são.

Na verdade, a nossa obsessão pela felicidade pode ser um grande tiro no pé: ela pode fazer com que sejamos menos felizes. Pois como é que podemos ficar bem se estamos o tempo todo nos perguntando como estamos nos sentindo, se estamos felizes ou não, se poderíamos estar mais felizes e se o vizinho está mais feliz?

Ou seja, buscar a felicidade pode ser justamente a fonte da nossa infelicidade. E também não adianta você fingir que não busca a felicidade, querendo, lá no fundo, que isso lhe traga felicidade. Não dá pra você se fazer cair nesse truque. Além disso, toda essa busca frustrada é baseada numa premissa errada, a de que somos poderosos o suficiente para ter tanto controle assim sobre nossas vidas. Por causa disso, pensamos que ser feliz só depende de tomar as decisões certas e que se ainda não sou feliz é porque estou fazendo algo errado. Infelizmente, não temos todo esse poder, nem sobre nós mesmos, que dirá sobre todas as circunstâncias à nossa volta que nos fazem bem ou mal.

Essa fantasia hedônica de uma vida sem dor é uma ilusão. Nossa esperança de viver sem tristeza, sem perdas e sem dificuldades é justamente a fonte do nosso sofrimento. Se esquecermos essa ilusão e buscarmos mais plenitude, em que enxergamos a beleza no todo — no bom e no ruim, no alegre e no triste, no sucesso e no fracasso — podemos sair da armadilha da busca pela felicidade e simplesmente viver. Por isso, gostaria de propor a você um exercício, que é considerar: e se não houver essa felicidade a ser atingida? E se a sua vida, hoje, fosse o melhor que as coisas ficam? Se não existir esse dia em que tudo vai ficar bem? Como você passaria a viver?

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