Insegurança: nosso grande segredo

Foto: Lauren Rushing
Foto: Lauren Rushing

“A tarefa que precisamos nos colocar não é de nos sentirmos seguros, mas a de tolerar a insegurança.”
Erich Fromm

Em 2011, participei de um workshop com Kelly G. Wilson no XX encontro da ABPMC em Salvador. Um dos fundadores da Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT), Wilson contou que em uma de suas oficinas, solicitou que os participantes escrevessem anonimamente, qual o seu problema mais essencial, íntimo, secreto. Surpreendentemente, as declarações eram muito semelhantes: “não sou bom o suficiente”, “não sou digno de ser amado”, “não sou inteligente”, “machuquei pessoas importantes para mim”, “sou feio” etc. Todas as respostas giravam em torno dessa autocondenação que nos persegue constantemente.

Todos nós temos esse segredo essencial — você também tem o seu e deve saber qual é; se não souber, basta um pouco de reflexão para chegar lá — e tentamos ao máximo esconder isso dos outros, às vezes de nós mesmos. Quando nos sentimos muito mal com esse nosso problema, olhar para as pessoas à nossa volta pode criar uma angústia ainda maior. Pois, assim como você, o outro também tenta esconder muito bem suas dificuldades essenciais e mostrar apenas uma face bem resolvida, confiante, segura. Todos nós temos os mesmos problemas e todos nós tentamos ocultá-los. Irônico, não? Ou seja, quem aparenta segurança apenas esconde bem a sua insegurança. Mesmo grandes artistas tremem antes de entrar no palco, não importa quantas vezes já tenham feito isso.

Toda vez que eu recebo uma nova pessoa buscando atendimento no consultório, sinto-me inseguro: “será que serei capaz de entender essa pessoa?”, “terei habilidade para ajudá-la?”, “ela vai gostar de mim?”, “vai voltar?”, “vai melhorar?”. No começo da minha carreira, sentir isso era particularmente angustiante. Hoje, ainda é difícil, mas sei que essa sensação é uma parte natural do processo — penso inclusive que a insegurança me torna um profissional melhor, pois me leva a avaliar o que faço, pedir a opinião de colegas e a mudar sempre que for necessário. Viver com essa nossa grande insegurança pode nos levar a gastar muita energia, especialmente com atitudes compensatórias. Acreditamos que vamos nos sentir melhor com as nossas falhas se ganharmos bastante dinheiro, se tivermos um cargo importante, se estivermos num relacionamento com alguém de ótima aparência. Só que essas “conquistas” nunca conseguem realmente tapar o buraco. E às vezes não percebemos como isso é inútil, ao continuamos tentando resolver o problema da mesma forma, pensando que se não estamos felizes é porque precisamos de ainda mais dinheiro, mais status, mais reconhecimento.

O fato é que buscar segurança, especialmente externamente, é um tiro no pé. Temos muito pouco controle sobre o que acontece conosco, de modo que tentar controlar o mundo gera ansiedade e frustração. Isso não quer dizer que devamos nos acomodar. Pelo contrário, devemos sempre fazer o melhor possível. Mas porque queremos viver de acordo com o que é importante para nós, sabendo que os resultados não estão nas nossas mãos. Se você quer viver de forma menos ansiosa, viva de acordo com seus valores, não em função dos resultados que quer provocar.

Se você está familiarizado com a língua inglesa, recomendo que acesse o site PostSecret. Esse site reúne cartões postais que as pessoas enviam com seus segredos. No meio das confissões, traumas e culpas que as pessoas ali conseguem expressar apenas veladamente, percebemos o quanto a nossa condição é comum, quanto temos vergonha daquilo que somos e o quanto pode ser difícil viver. Por outro lado, é inevitável, ao ler esses segredos, sentir uma grande compaixão por essas pessoas que são nossas irmãs no sofrimento. Queremos estender a mão e dizer a elas que entendemos, que é possível superar aquilo pelo qual elas estão passando, que elas não precisam se envergonhar. Mas, ao mesmo tempo, temos uma enorme dificuldade em direcionar essa atitude compassiva para nós mesmos. Por que será? Não merecemos, tanto quanto o outro, uma boa dose de compreensão e compaixão? Acredito que sim. E que uma vida boa talvez não signifique afastar as inseguranças a ponto de não sentirmos mais nada de negativo, e sim conseguirmos estender a mão para nós mesmos frente às dificuldades.

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