Recentemente, ganhei de uma amiga um livro que descreve um encontro entre o Dalai Lama e seu grande amigo, o arcebispo sul-africano Desmond Tutu. O livro, chamado de “The Book of Joy”, tem como tema central a possibilidade de se gerar alegria e contentamento mesmo quando enfrentamos as adversidades da vida. A pergunta que ambos tentam responder é “como viver bem mesmo em meio à pobreza, doença, estresse e ansiedade?”.
Em meio às conversas, Tutu fala sobre Nelson Mandela. Ele conta como Mandela chegou na prisão sendo um jovem cheio de raiva. Durante seus 27 anos na prisão, ele sofreu ainda mais, mas saiu dela como um homem magnânimo, empático e com capacidade para ouvir o outro lado. Como isso pode acontecer? O esperado seria que esse período o tivesse feito ainda mais amargo e raivoso, mas o efeito foi o contrário. Parece que Mandela conseguiu, a partir do sofrimento, se tornar um ser humano melhor.
A história de Mandela foi usada pelo arcebispo como uma ilustração de como os fracassos, os momentos de crise e a tristeza podem ter um efeito valioso em nossas vidas. Dependendo da forma como aproveitamos essas fases, podemos emergir delas transformados, com uma capacidade de enxergar a vida de uma maneira nova. É nos momentos em que fracassamos que reavaliamos nossos passos, aprendemos com nossos erros e decidimos mudar. Os percalços que enfrentamos são essenciais para nossa trajetória.
Entretanto, é muito comum que não saibamos como aproveitar isso. Muitos pais, no seu instinto de proteger os filhos, podem fazer com que as crianças não aprendam a sofrer e a tolerar frustrações, uma habilidade que fará muita falta na idade adulta. Mesmo a nossa cultura valoriza tanto o sucesso que temos vergonha de admitir que podemos errar ou sofrer. Recebemos, o tempo todo, receitas de como nos dar bem, de como ser bem sucedidos e de como chegarmos “lá”. O efeito disso é que nos sentimos extremamente inadequados quando fracassamos e não sabemos o que fazer com o sofrimento que ele nos traz.
Nesse contexto, é natural que muitas pessoas cheguem à terapia esperando que o terapeuta seja capaz de remover tanto o sofrimento quanto as possibilidade de fracasso na vida. Nós não podemos, é claro. Mas podemos, para aqueles que se dispõem a isso, ajudar a passar pela vida de uma forma diferente, que permita abraçar e aproveitar os fracassos. Muitos líderes espirituais argumentam que os momentos de dificuldade são aqueles em que podemos melhor entrar em contato com nossa natureza humana e, a partir disso, desenvolver uma relação diferente com o universo. Encarando dessa forma, o fracasso e a adversidade podem até ser bem-vindos.
Foto: Karl Fredrickson