Existe um conceito bastante marcante que é comum tanto à Terapia de Aceitação de Compromisso (ACT) quanto à Terapia Comportamental Dialética (TCD): o de disponibilidade. Em inglês, o termo utilizado é willingness. Não existe uma tradução precisa para essa palavra. Willingness pode significar complacência, conformidade, concordância. Gosto de usar o termo disponibilidade pois acredito que descreve melhor o seu uso nessas terapias.
Os criadores da ACT descrevem o conceito como “a escolha voluntária e baseada em valores de possibilitar ou manter contato com experiências privadas ou com os eventos que podem causá-las”1. Já na TCD, cita-se uma definição de Gerald May2: “disponibilidade significa abandonar a noção de ser separado e imergir profundamente no processo da vida em si. (…) Disponibilidade é dizer sim ao mistério de estar vivo a cada momento.” Em outras palavras, é ter abertura ao processo da vida, tal qual ele é, independentemente do que temamos que ele possa nos causar.
Geralmente nós tentamos controlar tudo o que acontece conosco. Buscamos, em especial, evitar tudo aquilo que imaginamos que pode nos trazer sofrimento ou dor. Muitas vezes deixamos de viver por não querer ter contato com a dor inevitável de escolhas difíceis ou dos riscos inerentes a um caminho que condiz com a forma como queremos viver. Esse controle e essa esquiva têm um custo alto. Em troca, na melhor das hipóteses, conseguimos com eles ficar apenas aliviados, quando conseguimos evitar tudo aquilo que tememos. Jon Kabat-Zinn descreve esse estado, metaforicamente, como “viver com o freio de mão puxado”.
Mudar esse padrão e mergulhar em tudo aquilo que a vida traz depende de uma compreensão e uma postura frente à própria existência que vai além da psicoterapia: depende de como a pessoa encara a vida, o universo, a existência. Se sentimos que somos apenas frágeis seres solitários soltos num mundo hostil, é muito difícil conseguir nos abrir. Se tememos cada cenário catastrófico que nossa mente cria, estaremos sempre dizendo “não” para todas as nossas possibilidades.
Por outro lado, quando se tem essa disponibilidade, ou seja, quando se diz “sim” para a vida, quando se “topa” a vida, com tudo que ela traz — alegrias e tristezas, sofrimentos e prazeres, paz e ansiedade — estamos realmente vivendo. Quando paramos para notar quão fantástico é cada momento, cada som, cada cor, cada detalhe que tomamos como trivial, estaremos nos abrindo. Se você conseguir ir a fundo nisso, e conseguir se encantar de verdade com o simples fato de estar vivo, você poderá aproveitar até mesmo as suas dores.
Referências
1. Hayes, S. C., Strosahl, K. D., & Wilson, K. G. (2011). Acceptance and commitment therapy: The process and practice of mindful change. Guilford Press.
2. May, G. G. (1982). Will and spirit: A contemplative psychology. San Francisco: Harper & Row.
Foto: Martin Sattler