10 dicas para mindfulness no lar

Ou 10 maneiras de retomar sua vida.

Esta é uma tradução do texto de Karen Maezen Miller, esposa, mãe e sacerdotisa zen em Los Angeles, Califórnia, e que mantém o blog Cheerio Road.

1. Acorde com o sol
Não há luz mais pura do que a da manhã quando você abre os olhos pela primeira vez.

2. Sente
Mindfulness sem meditação é apenas uma palavra.

3. Faça sua cama
O estado da cama é o estado da sua mente. Envolva seu dia em dignidade.

4. Esvazie os cestos
Lave a roupa sem ressentimento ou comentários e tenha um encontro íntimo com o tecido da vida.

5. Lave sua tigela
Enxágue a autoimportância e limpe sua própria bagunça. Se você não o fizer, vai ficar grudento.

6. Ative um timer
Se você se distrair com o peso do que não está feito, ative um relógio de cozinha e, como um monge no monastério, dedique-se de corpo e alma para a tarefa em questão até que o sino toque.

7. Varra as folhas
Varra, capine ou limpe o terreno. Você nunca vai realmente terminar, mas aprenderá a utilidade do inútil.

8. Coma quando estiver com fome
Alinhe os seus inextinguíveis desejos com o verdadeiro apetite.

9. Deixe a escuridão vir
Estabeleça um toque de recolher para a tecnologia e descubra o balanço natural entre a luz do dia e a escuridão, trabalho e descanso.

10. Durma quando estiver com sono.
Nada mais do que isso.

Foto: 喵_比比

O barco vazio

Há algum tempo, fui assistir a um concerto. A orquestra tocaria numa igreja, logo após a missa. Muitas das pessoas que haviam ido para a celebração religiosa permaneceram para o espetáculo. Assim que os músicos iniciaram a peça, percebi que, ao contrário do que costuma acontecer num teatro, o público não ficou totalmente em silêncio. Era possível ouvir algumas vozes, crianças falando ou chorando, pessoas se movimentando. Isso fez com que surgisse em mim uma certa irritação. Como o barulho não parava, percebi que minha atenção estava direcionada muito mais para a plateia do que para a orquestra, que tocava conforme o esperado.

Percebi, então, como minha mente estava criando uma realidade ideal paralela, totalmente distinta do que realmente está acontecendo. Para a minha mente, apenas os sons da orquestra eram válidos naquele ambiente. Ela se frustrava pelas coisas não saírem como o esperado e culpava as outras pessoas por isso. Dei-me conta de que a música, na verdade, não era só aquela produzida pelos instrumentos, e sim todos os sons do ambiente. A música da vida incluía a da orquestra, da plateia, do vento, das árvores e de tudo o mais que existia naquele momento. Ao entender isso, passei a aceitá-la por completo e a ouvir como música todos os sons presentes. Instantaneamente, a irritação se dissolveu.

Essa situação lembrou-me de uma clássica história zen, contada aqui por Pema Chödrön:

Há uma história zen em que um homem está curtindo o anoitecer em um barco num rio. Ele vê outro barco chegando em sua direção. A princípio, parece tão bom que mais alguém também está apreciando o rio em uma noite de verão. Então ele percebe que o barco está vindo exatamente na sua direção, cada vez mais rápido. Ele começa a ficar perturbado e passa a gritar: “Ei, cuidado! Pelo amor de Deus, vire pro lado!”. Mas o barco apenas acelera mais, bem em sua direção. A essa altura ele está em pé no barco, gritando e balançando os punhos. E o barco estraçalha tudo bem em cima dele. Ele ainda consegue ver que era um barco vazio. Essa é uma história clássica sobre a situação de nossa vida inteira.

Para mim, essa história é ainda mais significativa quando percebemos que os barcos que vêm em nossa direção estão sempre vazios.

Foto: Vision Chen

Pelo direito de se sentir mal

A fala mais comum das pessoas que eu atendo, em especial no começo da psicoterapia, segue mais ou menos essa linha: “tenho a sensação de que só eu estou sofrendo; todo mundo parece estar bem”. Em seguida, geralmente a pessoa descreve aquilo que sente, questionando-se se são as únicas a ter sofrimentos como: pensar demais, sentir ansiedade mesmo em situações cotidianas, preocupar-se com o futuro, com a morte, ter dificuldade em superar as perdas e assim por diante.

Não é curioso que se tenha a sensação de ser a única pessoa a passar por sofrimentos tão comuns à condição humana? O que poderia estar acontecendo? Um dos fatores pode estar ligado à nossa cultura, muito influenciada pela cultura americana, em que se percebe um fenômeno cada vez mais forte nas últimas décadas: a busca incessante pela felicidade.

Nós estamos obcecados com a felicidade. Cada um de nós tem a sua fórmula para buscá-la. Podemos acreditar que a felicidade está ligada ao sucesso, ao dinheiro, ao status, aos relacionamentos ou a uma ideologia. Acreditamos que o nosso objetivo na vida é sermos felizes, e partimos em busca desse estado como se estivéssemos partindo numa caça ao tesouro. Toda essa obsessão trouxe, com ela, um efeito colateral: nós nos tiramos o direito à tristeza. Mostrar-se triste passou a ser algo menos aceito. Temos que estar sempre bem, sorrindo, dispostos. Mesmo as pessoas próximas, com as melhores das intenções, ao verem você triste, tentam deixar você pra cima e te animar. Não só temos dificuldade em conviver com a própria tristeza; também a tristeza do outro é um incômodo do qual queremos nos livrar rapidamente.

E é justamente isso que leva muitas pessoas para a psicoterapia. Elas têm a sensação de estarem erradas por estarem tristes ou sofrendo. Mais do que isso, sentem-se mal por acharem que aquele sentimento é errado e porque percebem estar incomodando os outros com o seu mal estar. Diversas pessoas que já atendi diziam que a terapia era o lugar em que podiam falar sobre a dor, já que em todos os outros isso era muito pouco aceito. E além de um lugar para se expressar, essas pessoas buscam uma solução, pois acreditam que tem algo “quebrado” nelas.

Nos últimos anos, tem havido um movimento na tentativa de remover o estigma dos transtornos mentais. Isso poderia ser um passo na direção da tolerância frente ao que sentimos, mas o efeito pode ser justamente o contrário, já que esse movimento – geralmente financiado pela indústria farmacêutica – se baseia na perspectiva de que essas condições são transtornos ligados à desequilíbrios químicos. Como, nessa perspectiva, o sofrimento é visto como doença, reforça-se a ideia de que a tristeza, a ansiedade, a apatia, a falta de concentração são problemas a serem corrigidos, e não o tecido que compõe a experiência de estarmos vivos. Com isso, a pessoa que se vê com essas características continua se sentindo errada, embora ela passe a ter uma justificativa: “sinto-me mal porque tenho depressão”.

Em 1984, a escritora britânica Lesley Hazleton publicou um livro chamado The Right to Feel Bad (O Direito de Sentir-se Mal), em que ela afirma:

Sentir-se bem não é mais simplesmente um direito, mas um dever social e pessoal. Como podemos ver a depressão como uma emoção legítima? Como podemos evitar ser chamados de doentes ou errados quando a sentimos? Como podemos retomar a depressão das garras daqueles que defendem que qualquer coisa além de sentir-se bem é errada? Ver a depressão como patológica – ou seja, como doença – é uma forma de invalidá-la. Se tivéssemos permissão para nos sentirmos deprimidos – se permitíssemos a nós mesmos nos sentirmos assim – seria muito mais fácil tolerá-la.

Ou seja, parece que querer fazer com que as pessoas se sintam sempre bem e enxergando a depressão como doença pode ter o efeito oposto: as pessoas cobram-se tanto ao estarem deprimidas que isso pode deixá-las ainda pior, fazendo com que o sofrimento se prolongue ou se multiplique. É o mal estar causado por estar mal.

Nas terapias de terceira onda, como a ACT e a TCD, o componente de aceitação está bastante presente. Ao contrário de ser uma resignação, a aceitação é a abertura completa à nossa experiência de vida como seres humanos. Nessa perspectiva, enquanto terapeutas, nossa conduta não é consertar ninguém, e sim cultivar a abertura às experiências de vida de forma integral. Por isso, um dos componentes da nossa atuação é simplesmente estar junto com a pessoa e com o sofrimento dela, validando aquilo que ela sente. Lembro de um caso em que uma mulher, de meia idade, que tinha tido diversas perdas marcantes em sua vida, num curto espaço de tempo. Ela achava que já era hora de voltar a se sentir bem e se condenava por ainda estar triste. Eu comentei com ela:
– Considerando todas as perdas que teve, você não acha que pode ser totalmente natural que você “ainda” esteja triste?
– Você acha? – ela perguntou.
– Sim. Se eu tivesse passado pelo que você passou, é bem provável que estivesse me sentindo da mesma forma.
– Mas as pessoas dizem que eu tenho que superar, me alegrar, ficar bem.
– Bem, isso não é algo que realmente controlamos, não é verdade? Como seria para você a possibilidade de podermos ficar com esse sentimento o quanto for necessário, sem transformá-lo num problema a ser resolvido?
Depois de pensar um pouco, ela disse:
– Seria um grande alívio.

 

Foto: Guillaume Delebarre