Autoestima

Porque [o mestre] acredita em si mesmo,
ele não tenta convencer os outros.
Porque está contente consigo mesmo,
ele não precisa da aprovação dos outros.
Porque ele aceita a si mesmo,
o mundo inteiro o aceita.
Lao Tsé

Existe uma série de conceitos no nosso mundo contemporâneo que são sempre vistos de forma positiva, sem questionamentos. Por exemplo, temos a ideia de que crescimento econômico, sucesso, riqueza e poder são sempre desejáveis, sem considerar os custos e os problemas na sua obtenção e manutenção. São aspectos naturalmente buscados por pessoas ou países, que ignoram ou negligenciam seu lado negativo. Dentro da psicologia, e em especial na psicologia clínica, também existem conceitos que são sempre encarados como desejáveis e positivos. Entre eles, destaca-se o da autoestima.

A autoestima é definida como a avaliação positiva que fazemos de nós mesmos. Sendo assim, uma alta autoestima significa que nos avaliamos positivamente com frequência, enquanto que uma baixa autoestima significa que nos avaliamos positivamente raramente ou nunca. Parece, então, natural que queiramos ter uma autoestima alta. E essa é uma das queixas mais frequentes no consultório. “Quero melhorar minha autoestima” ou “meu problema é que minha autoestima é muito baixa” são frases que ouvimos com frequência das pessoas que atendemos.

Isso coloca o terapeuta numa situação delicada. Sabendo que a autoestima é um conceito, é algo que tem a ver com aquilo que dizemos para nós mesmos, como “eu sou bom nisso”, “eu faço isso bem”, “eu sou uma boa pessoa” e coisas do tipo, como levar a pessoa atendida a essa mudança? Uma saída rápida e tentadora é fazer com que a pessoa passe a dizer esse tipo de frase para si mesma. E esse método de fato já foi muito empregado por psicólogos que acreditavam que se as pessoas se convencessem de que elas são boas, seriam mais felizes. Mas isso não funciona, especialmente porque se a pessoa se considera boa mas isso não se reflete na sua vida, ela acreditará que existe algo de errado e injusto com o mundo ou com os outros. Ela poderá se tornar arrogante, com baixa tolerância à frustração e desconectada de seus pares. Aliás, é isso que acontece com toda uma geração de crianças e adolescentes que talvez tenham acreditado que são melhores do que os outros e merecedores de facilidades e vantagens.

Podemos perceber, então, que ter uma alta autoestima, especialmente quando injustificada, é um problema. Existem estudos que mostram que uma autoestima exagerada está associada com narcisismo, autoimagem irrealista e inflada, agressividade e bullying(1).

Acredito que o problema do conceito de autoestima está relacionado ao fato de envolver avaliação e julgamento. É muito complicado julgar pessoas — incluindo nós mesmos — porque ninguém pode ser resumido em um rótulo. Suponha que você se considere tímido, ou tímida. Você é sempre assim, ou só em algumas situações, com algumas pessoas? Você age de maneira tímida 100% do tempo? Se não, então o rótulo não é adequado. Percebe como uma palavra é muito restrita para classificar alguém? Quando buscamos uma avaliação positiva de nós mesmos, ficamos preso nessa autoavaliação constante que provavelmente trará mais angústia do que satisfação, além de nos afastar da experiência do momento.

Kristin D. Neff(1) propõe que a busca por autoestima seja substituída pelo cultivo da autocompaixão, que, segundo ela, levam a um funcionamento mais saudável e maior satisfação com a vida. A autocompaixão estaria associada com menor comparação social, constrangimento em público, ruminação, raiva e rigidez cognitiva. A autocompaixão envolve ser compreensivo e bondoso consigo mesmo, especialmente em situações em que falhamos ou nos sentimos inadequados. A partir daí, podemos ajudar a nós mesmos com o que é necessário, sem nos julgar ou nos mortificar.

O que pensamos sobre nós mesmos ou sobre nossas vidas não pode ser mais importante do que aquilo que de fato somos e o que a nossa vida de fato é. Tentar mudar os conceitos sem mudar a realidade que os geram é inútil. Portanto, levar uma vida significativa, condizente com nossos valores trará naturalmente uma satisfação conosco, sem depender de autoavaliações ou comparações com os outros.

Referência

  1. The Science os Self-Compassion, de Kristin D. Neff. Capítulo do livro Wisdom and Compassion in Psychotherapy, de Germer & Siegel, publicado em 2012 pela Guilford Press.

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