Simplicidade voluntária

Foto: Danielle Christine
Foto: Danielle Christine

Fui para a mata porque queria viver deliberadamente, enfrentar apenas os fatos essenciais da vida e ver se não poderia aprender o que ela tinha a ensinar, em vez de, vindo a morrer, descobrir que não tinha vivido.
Henry David Thoreau

Um fenômeno crescente nos últimos anos é a adesão de pessoas a uma forma de vida mais simples, não por necessidade, mas por opção. No nosso mundo urbano e industrializado, somos dirigidos a consumir o máximo que pudermos, sendo o único limite o dinheiro que possuímos (ou, às vezes, até o que não possuímos). Entretanto, muitas pessoas têm percebido que o consumo excessivo e a posse de bens materiais não significam uma vida mais feliz — em muitos casos, pode ser o contrário — e escolhem abrir mão de compras, coisas e até carreiras.

Uma das definições da simplicidade voluntária (do coletivo da simplicidade) afirma que a rejeição do consumismo surge do reconhecimento que os hábitos de consumo ocidentais estão degradando o planeta; que viver consumindo excessivamente não é ético num mundo em que muitas pessoas têm necessidades; que o sentido da vida não é e não pode consistir no consumo ou no acúmulo de bens materiais.

Ou seja, percebe-se que há três motivações principais para uma vida mais simples. A primeira delas é ecológica, ao compreender que nossos hábitos podem ser agressivos ao planeta. A menos que você já tenha uma vida bastante simples, seu estilo de vida pode tirar mais do planeta do que ele é capaz de recuperar. Para saber mais, confira a sua pegada ecológica (clique no Brasil para fazer o teste em português). A segunda motivação é ética: num mundo com recursos limitados, tomar demais pode significar tirar do outro; o excesso de um é a escassez do outro. O terceiro motivo é pessoal. O consumismo simplesmente não entrega o que promete. Trabalhamos demais, fazemos dívidas e destruímos o planeta na tentativa de sermos felizes, e isso simplesmente não funciona. Triste, não?

A ideia de uma vida mais simples não é algo novo. Em 1854, Henry David Thoreau publicou Walden, uma autobiografia que descreve os anos em que, voluntariamente, morou sozinho na floresta próxima ao lago Walden, em Concord, nos Estados Unidos. Nesse período, Thoreau viveu com o mínimo possível, buscando ter contato apenas com o essencial da vida. O livro condena a sociedade consumista e capitalista da época, mas é surpreendente perceber como as críticas permanecem atuais. Clique a seguir para baixar o texto completo: Walden ou A Vida nos Bosques.

Você pode estar se perguntando se precisa ir morar numa cabana isolada no meio do mato para conseguir uma vida mais simples. É claro que não. Mas existem diversas coisas que você pode fazer para simplificar sua vida.

1. Questione
A primeira coisa é mudar a sua forma de encarar o consumo e a relação com os bens materiais. Nós tendemos a pensar “eu quero isso” sem avaliar qual o real custo daquilo que queremos. Quando consumimos algo, o custo não é apenas o que pagamos, mas também o de armazenar, de cuidar, de consertar, de descartar. Em vez de focar apenas no “querer”, você pode se perguntar, ao longo de alguns dias: “eu preciso realmente disso?”, “estou disposto a arcar com todos os custos que isso vai me trazer?”, “no longo prazo, isso vai realmente melhorar a minha vida?”. Se a resposta para qualquer dessas perguntas for não, abra mão do seu desejo.

2. Doe
A generosidade não é apenas éticamente louvável. Ela também nos torna mais felizes. Faça o teste: compare aquilo que você sente ao comprar uma coisa nova ou a dar algo para alguém. Tente perceber qual dessas atitudes leva a um bem estar mais significativo e mais duradouro. Vasculhe a sua casa e liste tudo aquilo que você não usa mais (roupas, objetos, móveis). Cuidado com as armadilhas que você vai se colocar mentalmente, como “posso precisar disso um dia”. Se você precisar, pode pedir emprestado. Procure só manter aquilo que você de fato usa com frequência. Desfaça-se do resto (doe ou venda). Você terá mais espaço, menos coisas para arrumar e conservar.

3. Avalie seu estilo de vida
Como você se locomove? Como é a sua alimentação? O seu lazer? Se você anda sozinho de carro, se come apenas alimentos industrializados e se sua noção de diversão é um passeio no shopping, talvez seja a hora de parar para pensar. O que você está fazendo com seu tempo, com seu corpo, com o seu planeta? O seu modo de vida tem feito você feliz? Ou você está sempre esperando aquele dia mágico em que a felicidade finalmente chegará?

Algo a se considerar também é o seu trabalho. Você gosta do que faz? Consegue trabalhar apenas as horas suficientes e aproveitar o resto do seu dia? Se você não gosta do seu trabalho ou trabalha demais apenas pelo retorno financeiro, considere o custo que isso realmente tem na sua vida. Qual o sentido de ter dinheiro se você não tem tempo, ou ganhar dinheiro apenas para continuar vivendo fazendo algo que não faz sentido para você? Veja o caso desse dentista que abriu mão de 80% da sua renda para viver uma vida mais simples.

Nós temos apenas uma vida, e diariamente escolhemos como a vivemos. Como você está vivendo a sua? Nós não estamos sozinhos no planeta. Temos sete bilhões de outros “eus” tentando viver bem e ser felizes assim como nós. Isso sem falar das outras formas de vida como animais e plantas. Temos uma responsabilidade com todos eles. Tendemos a achar que devemos consumir o máximo, o quanto nosso salário — ou o limite do nosso cartão de crédito — permite. Mas isso, além de ser impossível, não tem nos deixado mais felizes. Talvez uma forma melhor seja entender que tudo que consumimos — não importa se pagamos por aquilo ou não — é um empréstimo tomado do planeta e das outras pessoas. Dessa forma, podemos entender que cada um de nós tem direito apenas a uma pequena parte, aquela que é suficiente. E viver com essa parte suficiente não é apenas social e ecologicamente justo, mas também é o caminho para uma vida boa.

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